terça-feira, 17 de junho de 2014

REESCREVENDO A HISTÓRIA

Post de Berto Filho

Agora o espaço é tomado pelo Merval Pereira, que não foi citado na lista negra de jornalistas criada pelo PT, conforme revelei no post anterior. Ele tem batido com maior suavidade nas mazelas do atual governo do que os demais que estão na lista. Como Joaquim Barbosa, Merval foi contra as vaias e xingamentos a Dilma. Não acredito que ele queira salvo-conduto ou coisa parecida, mas espero que ele se posicione em relação à ameaça do PT contra jornalistas que não rezam pela cartilha do partido.

Leia.

Reescrever a História é um hábito dos políticos que estão no poder, teimando em fazer valer suas versões sobre o realmente acontecido, especialmente em época de eleição. O ex-presidente Lula é um perito nessa manipulação da História recente, sem se dar conta de que o registro dos fatos, hoje, é bem mais fácil de se fazer.

A agressão verbal sofrida pela presidente Dilma no Itaquerão, deplorável por todas as razões, está sendo usada de maneira desabrida pelo PT e por seus aliados para uma manobra política, como se fosse agressão à mulher e mãe de família, quando em nenhum momento essas condições estiveram em jogo. Ou então à instituição da Presidência da República, o que é uma bobagem.

O próprio Lula, na eleição de 1989, chamava o então presidente Sarney de ladrão, e depois também o presidente eleito Fernando Collor, que também xingou Sarney. O fato de os três hoje serem do mesmo grupo político diz bem sobre o tipo de política que praticam.

No episódio atual, a presidente Dilma passou a ser tratada como uma senhora frágil e desacostumada a essa linguagem, quando ela própria já demonstrou, em reuniões com ministros e empresários, que sabe lidar com esse tipo de problema. Que o digam os ministros que já saíram chorando de seu gabinete depois de uma boa espinafração.

Lula, então, já tem registrado o seu hábito de falar palavrões em situações de diversos tipos, bastando ler o excelente livro “Viagens com o Presidente”, dos jornalistas Eduardo Scolese e Leonencio Nossa.

Outra releitura é a defesa da tese de que o PSDB tentou um golpe em 2005 para tirar Lula do Palácio do Planalto. O PT, por experiência própria, sabe que corre o risco de perder a eleição de outubro, principalmente devido à inflação, e por isso Lula está inquieto, inventando fantasmas.

Revelei em uma coluna de 2008 que relembro agora que, na crise política de 2005 desencadeada pelo mensalão, o que abalava o presidente não era propriamente a crise em si, mas saber que a situação econômica não estava melhorando: a inflação, de 5,69%, embora em queda, continuava alta, e o PIB crescera apenas 2,3% naquele ano, ficando à frente apenas do Haiti na região.

Temos hoje uma inflação que deve estar chegando ao teto da meta de 6,5% na época da eleição, e um crescimento da economia em torno de 1%. Quando, naquele momento delicado de 2005, analisava-se a hipótese de o presidente Lula não concorrer à reeleição, os petistas menos realistas que o rei, como agora, acusavam a “mídia golpista” de trabalhar contra o governo.

O atual ministro Gilberto Carvalho, então secretário particular de Lula, revelou em uma entrevista que a hipótese foi longamente cogitada pela cúpula do governo, que considerava, inclusive, que o impeachment de Lula poderia acontecer. Os então ministros Antonio Palocci e Márcio Thomaz Bastos chegaram certa noite a sugerir ao presidente Lula que fizesse um acordo com a oposição: em troca de poder cumprir todo o seu mandato, abriria mão da reeleição.

Esse desfecho só não se deu porque, de um lado, Lula em nenhum momento perdeu o controle da situação, segundo o relato de Gilberto Carvalho — embora na ocasião houvesse informações de que o presidente tinha fases de bastante depressão —, mas também porque a oposição temeu uma reação dos chamados “movimentos sociais”.

Difundiu-se a imagem, feita pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de que havia o perigo de se criar um “Getulio vivo” com a deposição de Lula, e seria melhor deixá-lo “sangrando” até o fim do governo. Não se sabe se a avaliação de que a deposição de Lula provocaria uma revolta popular estava correta, mas, pelo relato de Gilberto Carvalho, essa hipótese não era levada muito a sério pela cúpula do governo.

Por outro lado, Lula, em vez de “sangrar em praça pública”, recuperou o fôlego, graças à queda da inflação, reduzida para 3,14% em 2006, e a economia melhorou um pouco, com o PIB crescendo 2,9% naquele ano de eleição, permitindo que Lula acenasse com anos melhores, que se concretizaram em 2007, com o PIB crescendo 5,4%.

Mas a inflação dava sinais naquele ano de 2007 de que não estava controlada, ficando em 4,5%, índice que, embora estivesse dentro das previsões do governo, era maior que o do ano anterior. A presidente Dilma não terá tempo para recuperar a economia neste ano, e essa é a principal ameaça à sua reeleição.

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